sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Laissez faire, laissez aller, laissez passer...


Gosto dessa expressão em latim. Na verdade virou moda, né? Segundo post que coloco uma expressão utilizando uma lingua morta. Talvez eu seja um pouco mórbido mesmo! rs


Ela quer dizer "deixai fazer, deixai ir, deixai passar...". Perfeita consonância com a experiência que compartilharei aqui:

Salvador, 03 de Fevereiro de 2012

Num final de tarde soteropolitana, constando 30 º no relógio em frente ao farol da barra, caminho com relativa dificuldade. É notório meu mal humor e semblante de preocupação. Há cerca de um mês, torci o tornozelo jogando futsal na quadra do Savina (colégio tradicional de Itapetinga) e desde então fui impedido de realizar minhas atividades físicas rotineiras (e prazerosas). Dei um pique até o porto, mas na volta resolvi voltar caminhando devido ao receio de prolongar minha lesão. Quando estava passando pelo que já foi o clube espanhol, recebo um empurrão e subitamente sinto que minha corrente e pingente (ambos de ouro e de imensurável valor afetivo) foram arrancados. Quando tento identificar o autor, vejo um ladino de lvl 2 correndo (num ritmo de cooper ao meu lado). 

Definitivamente me tornei um cara profundamente racional. Comecei a pensar em algumas possibilidades: 

- O ladrão é menor do que eu. Goza de porte físico semelhante. Trajava uma bermuda preta de malha e uma camisa vermelha. Arma de fogo? Não. Arma branca ou algo parecido? Talvez; 

- Vindo ao meu encontro (sem perceber o que ocorrera) três brutamontes. Poderia alertá-los do ocorrido e pedido ajuda. Mas vivemos numa sociedade egocêntrica (talvez não fizessem nada), provavelmente seriam bem lentos e não conseguiriam nos alcançar e caso o ladrão estivesse armado, me encontrariam fatiado. Fora o agravante da greve dos policiais. Poderia existir comparsas, o que agravaria minha situação; 

- Estou com um tornozelo torcido e provavelmente não conseguiria alcança-lo caso tentasse recuperar meus pertences. Mesmo gozando de saúde perfeita, provavelmente o estimulo dele seria bem maior do que o meu numa corrida ^^ 

- Fui assaltado de maneira semelhante no carnaval de longos anos atrás. Roubaram uma volta e um pingente de ouro que Dona Liege (mãe) havia me dado. O que foi roubado hoje era presente do meu pai. 7-8 anos de bom uso e com o devido cuidado. Pagou o valor material. Se o "Um anel" teve mais de um dono, por que minha joia preciosa não pode ter também? rs

Tirando a alusão ao senhor dos anéis, pensei em tudo isso quando o via - do outro lado da rua - em direção ao morro do gato. 

Sabia da periculosidade que se encontra Salvador devido à greve da polícia, mas infelizmente essa volta fazia parte do meu corpo e esqueci completamente de tirá-la.

Pela primeira vez não tive um sentimento de impotência ou indignação por ter sido roubado. O que isso quer dizer não sei responder-lhes. Naturalização da violência? Conformismo? Resignação? Medo travestido de racionalidade?

Faço parte dessa violência. Antes, de maneira peremptória, acusaria o outro, desferiria diversos impropérios e o colocaria como representação máxima da pútrida estirpe humana. Mas posso refletir um pouco mais e adentrar numa seara sociológica. A violência é condição sine qua non do ser humano, ou encontra-se em contextos permeados de injustiças dos mais variados âmbitos? 

Prontidão, amigos que moram aqui. Mas lembrem-se que o outro de hoje, o rapaz do cooper mencionado acima, é elemento fortemente representativo de nossa sociedade. É uma mensagem imperativa de que muita coisa precisa mudar e nos faz pensar que o "deixai fazer, deixai ir, deixai passar" não condiz com o tipo de conduta necessária a fim de alcançar uma desejosa mudança paradigmática.



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