terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Roleta Russa


Quando sou assolado por algo deveras tortuoso como a morte de um ente próximo, ou próximo dos nossos próximos, costumo pensar acerca da trivialidade da vida e do quão frágil somos diante da mais poderosa certeza que nos cerca. A inquietação torna-se maior quando – involuntariamente – estamos sobre o efeito de uma teleologia mórbida nos questionando quem será o próximo. Duas coisas normalmente vêm à tona ao imergir nesses pensamentos:

1 – Gostaria de ser o primeiro a perecer, pois não precisaria passar pelo sofrimento de sentir parte de mim adentrando numa dimensão desconhecida, sentir o aroma da morte cerceando meu mundo, meus amigos;

2 – Uma hierarquização dos que poderão partir antes de mim, o porquê dessas constatações e a pronta certeza que esse é um exercício prementemente inócuo;

Uma frase, certa vez, me sensibilizou, convidando-me a pensar diferente. Atacava meu egoísmo de querer ser o primeiro, da fuga de um necessário sofrimento. A frase dizia que o amor verdadeiro era aquele que andava de mãos dadas com a abnegação, permitindo a partida de todos, deixando-te como o responsável à apagar as luzes. A justificativa tornavam as coisas ainda mais simples: antes eu passando por todas essas dores do que eles. Os demais não precisariam passar pelo tortuoso cotidiano da falta, da saudade excruciante...

Senti-me estimulado a flertar com essas reflexões após ter sido vítima – mais uma vez! - de uma tentativa de assalto quando retornava a Vitoria da Conquista. Quatro homens em duas motos surgiram de uma estrada secundária e tentaram incessantemente fazer com que eu parasse o carro. Depois que vi o semblante de um dos assaltantes da moto que se encontrava a minha frente, tive a pronta certeza de que faria qualquer coisa, menos ceder à pressão dos mesmos. A frieza no olhar daquele homem foi o suficiente para fazer com que eu utilizasse toda pericia automobilística aprendida a fim de subir os seis quilômetros da serra do marçal – que é extremamente sinuosa e perigosa – a mais de 100 km/h. Algumas vezes abaixava a cabeça com receio de ser alvejado por algum projetil. Ao final da serra, já havia colocado boa distância dos perseguidores, parei no posto da polícia rodoviária federal e informei do ocorrido. O profissionalismo dos policiais me chamou atenção: “Por que você não passou por cima deles?!” inquirira uma policial exaltada; seu parceiro, que me olhava com aparência de que tomaria uma medida mais producente, simplesmente continuo a me olhar sem balbuciar um som que fosse. Ouvi comentários de algumas pessoas que estavam sentadas próximas à guarita exaltando a fuga e resolvi concluir a viagem.

Ciclicamente sou alvo de investidas indigestas como a que acabei de ilustrar. O que me convida a pensar num desfecho traumático para essa vida ansiosa de novas conquistas e realizações. Mas prefiro direcionar atentar para as coisas que estão na minha esfera de poder e acreditar levianamente no comentário gracejado de um amigo “[...] os caras devem achar que você é um turista japonês indefeso...”. 



Um comentário:

  1. Certa vez cheguei a conclusão de que seria muito egoísmo escolher o fim para que não pudesse sofrer pela perda daqueles que amo. Então lembrei de todos aqueles que precisam de mim vivo e daqueles que irão precisar. Ainda ontem minha mãe disse que a morte é o maior prêmio da vida. Sendo que a vida é o maior presente que se pode dar. Quantos buscam a segunda chance e ainda tem aqueles que lutam para nos dar a vida.

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